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Entrevista com Rita do Val


21/11/2016
9:44 AM
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Raphael Pozzi
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Atualizado em 21/11/2016 10:09 am

O último dia 9 de novembro marcou a vitória de Donald Trump, do Partido Republicano, nas eleições para a presidência dos Estados Unidos a partir do ano que vem. Ele ficará por quatro anos no comando de uma das maiores potências mundiais. O grande problema é que em sua campanha Trump fez declarações polêmicas que levaram grande parte da população mundial a criticar sua eleição. Ele disse, entre outras coisas, que “quando o México manda seu povo aos Estados Unidos, eles mandam pessoas que têm um monte de problemas e trazem estes problemas para nós (eles). Eles trazem as drogas, o crime, são estupradores”. A proposta para resolver esse problema? A construção de um muro na fronteira entre os países.

Para a coordenadora do curso de Relações Internacionais da Faculdade Santa Marcelina (FASM), Rita do Val, esse tipo de declaração pode inflamar pessoas que têm essas opiniões mas guardavam para si o preconceito. É como abrir uma caixa e deixar escapar tudo o que tem dentro. “Acaba fazendo com que opiniões que estavam escondidas e são muito prejudiciais à sociedade voltem à tona. O meu temor maior é esse, tanto no individual quanto no coletivo. Que esses grupos preconceituosos achem que têm força, que podem tomar atitudes violentas”, explicou a professora.

 

Folha Metropolitana – No que a vitória do Donald Trump vai afetar o Brasil?

Rita do Val – Em um primeiro momento é difícil estabelecer essa relação. É preciso olhar pra trás pra entender: quais políticas o Barack Obama realizou com o Brasil enquanto esteve no comando? Não houve muito avanço. A gente continua ocupando o mesmo espaço na visão dos Estados Unidos. O Brasil é um grande parceiro comercial, a gente exporta muitos produtos para lá, mas não houve nenhuma mudança na relação além dessa consolidação de parceria comercial. Houve um ensaio com relação à retirada do visto dos brasileiros, mas isso não avançou e dificilmente vai andar com o Trump.

 

Portanto não muda muita coisa para o brasileiro?

É o que esperamos. Talvez haja um protecionismo maior, mas a parceria deve continuar existindo. O Trump sempre diz que vai adotar medidas para proteger produtos norte-americanos. Se isso acontecer, claro, pode afetar nossa economia. Na questão migratória, ele diz que será mais criterioso com o ingresso de estrangeiros. Mas isso é para quem quer ir para lá, né? Como tem muitos brasileiros vivendo por lá de forma ilegal, visto por esse ponto, com ele prendendo, processando e condenando essas pessoas, a política dos Estados Unidos vai nos afetar. Em outro sentido, me parece que o foco dele não será a América Latina. Ele se concentra, pelo menos no discurso, nas parcerias com a Europa, como uma aproximação com a Rússia para o combate ao terrorismo.

 

Quais são as ideias dele para os conflitos no Oriente Médio?

O que ele tem dito é que vai dar continuidade ao processo de intervenção na Síria para combater o Estado Islâmico. O Trump fala em colocar fim no conflito agindo militarmente. Isso, a meu ver, não é tão inteligente. Existem medidas mais necessárias do que o ataque armado a esses grupos de terrorismo. Eu explico: tem que se descobrir de onde vem o dinheiro para que eles consigam comprar armas que só exércitos têm acesso.  Para você desconstruir uma estrutura como a do Estado Islâmico, que está enraizada em diversos locais e se espalhou por vários pontos do mundo, você tem que agir de forma inteligente. O Trump fala em se aliar à Rússia e dar respaldo ao presidente da Síria, Bashar al-Assad, para resolver. Mas se agisse de outra forma, mais trabalhada, descobrir onde estão as células, quem comanda, quem abastece com dinheiro, acredito que seria mais fácil de combater esse problema.

 

Eles estão indo pro caminho errado?

Sem dúvida. Mas eu acredito que o Congresso americano tenha mais cuidado nesse sentido. Se eles lançarem uma guerra, bombardearem, não vai resolver.

 

Não é, no mínimo, engraçado os Estados Unidos proporem uma união com a Rússia?

Sim, faz tempo que brigam, têm conflitos. Desde o fim da Guerra Fria eles se alfinetam. Isso seria uma mudança importante no cenário internacional, ainda que eu defenda que a forma do combate deva ser outra.

 

A vitória do Trump pode indicar uma intolerância maior dos americanos com imigrantes?

Hoje os Estados Unidos têm um problema bem semelhante ao nosso: existe uma classe média que empobreceu, por lá a grande parte é rural. Eles têm menor escolaridade, estão desempregados, sem colocação no mercado de trabalho. As regiões historicamente industriais viraram locais fantasmas, porque as empresas faliram. Esse modelo econômico se esgotou. Trump diz que sabe de quem é a culpa: primeiro de uma política protecionista do terceiro mundo e, segundo, dos imigrantes que roubam empregos dos americanos. Isso não é verdade. No imaginário popular é bom se ter um inimigo, um culpado, que se possa combater. Ele diz que tem a solução e muitos acreditaram nisso.

 

O Trump será o homem mais poderoso do mundo a partir do ano que vem. O que devemos esperar?

Eu acho que a gente tem que mandar energia positiva para eles, mas ao mesmo tempo temos que prestar atenção no que está acontecendo. Veja que existe uma onda de protestos por lá. Outro dia uma prefeita apoiou uma frase que chamava a Michelle Obama de “macaca de salto alto”. Esse tipo de manifestação precisa ser observada. Com a fala preconceituosa, ela estimula muita gente que pensa dessa maneira. O Trump também, com os discursos dele, acaba fazendo com que opiniões que estavam escondidas e são muito prejudiciais à sociedade voltem à tona. O meu temor maior é esse, tanto no individual quanto no coletivo. Que esses grupos preconceituosos achem que têm força, que podem tomar atitudes violentas. Na política, o Trump é limitado, precisa passar pelo Congresso. Na fala, não. Ele pode ser mais prejudicial neste sentido e isso afeta não só os Estados Unidos, mas o mundo todo.


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