Longa Missão
14/01/2015
7:15 PM
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Paulo Manso / Foto: Alexandre de Paulo
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Atualizado em 15/01/2015 10:47 am
Militar entrega donativos em aldeia isolada próxima da República Dominicana
A cerimônia de troca de contingentes dos batalhões brasileiros no Haiti ocorreu durante a semana de nossa estada em Porto Príncipe. Acompanhamos a despedida do 20º e a chegada do 21º grupo de homens e mulheres que mudaram minha percepção sobre o trabalho das Forças Armadas.
Quando saí do Brasil, esforcei-me para lembrar de algo positivo sobre os militares que fosse além das saudosas histórias vividas por meu pai quando serviu na Base Aérea de Cumbica, em Guarulhos, na Grande SP. Não consegui! Confesso que pisei em solo haitiano com a visão obscurecida pela falta de informações precisas e livres de preconceito.
Por aqui, não faltam dedos apontados: se gasta muito para nosso Exército salvar terra alheia; a intenção que nos motivou a assumir a Minustah (cadeira permanente no Conselho de Segurança da ONU) não foi alcançada; etc. Mas a semana hospedado no Campo Charlie clareou bastante as coisas.
É bem verdade que o objetivo principal do então presidente Lula, em 2004, era melhorar a imagem do País no exterior. E a oportunidade de assumir o componente militar de uma missão de paz da ONU vinha a calhar. A violência era exponencial no Haiti após a saída forçada do contestado presidente Jean Aristide. E o Exército brasileiro não bateu na porta antes de entrar.
Afinal, ao pé da letra, é para isso que servem as Forças Armadas. Para combater. E a guerra civil foi suprimida com relativo sucesso. Três anos depois de iniciada a missão, foi conquistada a última resistência do crime organizado: a comunidade de Cité Soleil. A partir de 2007, portanto, os militares poderiam até mesmo voltar para casa.
Mas, na prática, não é assim que a coisa funciona. E o Exército passou, então, a atuar de forma diferente. Seguiu com as patrulhas armadas (o que ocorre até hoje) para manter a “sensação de segurança”, e começou a fortalecer as instituições haitianas, principalmente a Polícia Nacional (PNH).
Veio o terremoto, em 2010, e a atuação voltou a ser alterada, desta vez, para ações humanitárias e de reconstrução do Haiti, com obras de engenharia. Apesar da extrema miséria, não se vê mais as montanhas de lixo e entulho no meio das ruas de Porto Príncipe. Os militares brasileiros abrem ruas, pavimentam vias, constroem pontes, cavam poços artesianos, apoiam ONGs e instituições religiosas que fazem ações sociais, realizam partos e atendimentos médicos, etc.
Não é pouca coisa! Mas é, no mínimo, bem diferente do objetivo principal de uma força militar. Quando o assunto é repressão, o braço militar da Minustah está no “nível 3”. Ou seja, se há uma ocorrência, primeiro é acionada a PNH. Se esta não der conta do recado, chama-se a UNPOL (Polícia da ONU). Somente se nenhuma das duas polícias resolverem o problema é que entra em cena o Exército.
Patrulhas armadas continuam para manter o “ambiente seguro e estável”