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Falta segurança e assistência médica


13/01/2015
7:27 PM
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Paulo Manso / Fotos: Alexandre de Paulo
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Atualizado em 14/01/2015 11:04 am

Em um barraco aberto nas laterais e com o telhado de palha destroçado, uma senhora usava carvão para esquentar um óleo e fritar algo parecido com um pastel. Etide Méri, de 65 anos (exceção em um país que possui expectativa de vida de apenas 49), afirmou morar em Port Glacé há 15. Desde 2003 vive de vender arroz e aqueles “pastéis”, feitos de uma massa de farinha e recheio de carne de frango. Teve 11 filhos. Um deles morreu assassinado, assim como o marido.

A matança teria sido motivada por uma dívida pela compra de carvão (muitos ali produzem e vendem o produto). “Na ocasião, mulheres grávidas morreram porque entraram no lago para fugir dos assassinos”, explicou Lys Barthold, de 57 anos. “Vivemos mal aqui. Não temos segurança. As mulheres grávidas não têm qualquer assistência”, disse Bonheur Louimeus, de 42 anos.

A falta de assistência médica foi o que obrigou a jovem Dude Leimy, de 18 anos, a ter sua filha pelas mãos de Oceani Amilka. Uma velha parteira (fam chai, em creoule) da aldeia que disse não saber a própria idade.

Leimy mora em um barraco de pau a pique (como todos ali) de 2 por 2,5 metros, com 2 de altura do chão de terra pisada até o telhado de palha. Vive com seu marido Jean-Bernard, pescador também de 18 anos, e a pequena e linda Jean-Berlin, de apenas 4 meses de vida. Pagam aluguel da pequena caixinha quente e úmida em que moram. A porta é improvisada com um pedaço de metal. As dobradiças são pedaços de sandália velha pregados em tampas de plástico de algum refrigerante.

Passamos por outro barraco e encontramos Bebí. Seu nome é Robenson Chéry. Tem 24 anos e tentava consertar uma engenhoca. Uma placa velha de captação de energia solar estava encostada em seu barraco. Deveria alimentar um pequeno rádio, mas não estava funcionando. Bebí já acompanhou pelo aparelho jogos do Barcelona e do Real Madrid. Perguntei se ele conhece o Corinthians, meu time de coração. “Oui, oui!”, se apressou a dizer, com o sorriso nos lábios de quem se lembra de “Ronaldô Fenômeno”. O futebol é mesmo algo universal! A alguns metros dali, um campo montado pelos oficiais do Braengcoy reunia uma turma numerosa.

Naquele momento, um som chamou nossa atenção. Perto dali, o dono de outro barraco fez o que Bebí não conseguiu. Sua placa de energia solar alimentava eficientemente um pequeno rádio. No meio do nada, uma placa encostada numa árvore, de onde saiam dois fios que faziam tocar “Never Say Never”, de Justin Bieber.

As histórias tristes se sucediam. Na cabana do atendimento médico, uma mulher fazia cara de dor ao ser submetida a um curativo nos pés judiados. Mas o que seria aquela dor física perto daquela que a fome e o desamparo causam todos os dias?

Conforme os donativos iam acabando, a coisa ficava mais complicada. Um oficial comentou, depois, que aquele povo vive um instinto de sobrevivência que prioriza o hoje, não o amanhã. “Eles não têm noção de dividir. Precisam sobreviver. Para isso, chegam a tirar as coisas dos outros por não saber se alguém dará o que comer amanhã. O que importa é garantir o hoje”, disse. Alguns trocaram de roupa para tentar receber novamente os donativos. E, aos poucos, pessoas de outras aldeias próximas começaram a chegar e o clima ficou diferente. Não sabemos se permaneceu amistoso depois que saímos de lá.

À noite, já de volta a Porto Príncipe, eu e Alexandre rezamos juntos por aqueles pobres na diminuta capela dos soldados.

Homem sobrevive produzindo carvão na aldeia Port Glacé, na fronteira com a República Dominicana



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