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Ponto de Vista – O corpo de quem foi e ainda existe


12/05/2017
9:39 AM
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Alfredo Henrique
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Atualizado em 12/05/2017 9:39 am

O silêncio é necessário para percebermos as coisas que ocorrem ao nosso redor e, também, para refletir sobre palavras ouvidas e sentimentos provocados por causa delas.

Porém, viver em completa incomunicabilidade, a não ser que, resolvamos ser monges contemplativos numa montanha, é algo impossível e, em minha opinião, prejudicial.

É necessário compartilhar visões de mundo com as pessoas – isso faz do nosso viver interessante e rico.

Porém, há circunstâncias as quais fazem com que, aos poucos, algumas bocas se calem – mesmo com o corpo funcionando e somente isso

Há alguns anos, minha avó foi diagnosticada com Alzheimer. As pessoas que desenvolvem a doença, que ainda é incurável, vão aos poucos perdendo a capacidade de reter lembranças sobre elas e, inclusive, de gente próxima.

Da mesma forma que um fio d’água, vai aos poucos abrindo caminho em superfícies sólidas. O Alzheimer mina a memória dos enfermos e, inevitavelmente, atinge quem fica ao lado deles.

Percebi o quanto a doença é séria quando vovó me olhou e perguntou: “Quem é você?”.

Ela, uma mulher franzina, encarou com coragem a doença, juntamente com seus filhos e netos, que tentaram manter a sua mente ativa, na medida do possível, até o limite.

Depois que fiquei mais velho, frequentei menos a casa da velhinha. Isso contribuiu para que percebesse mais explicitamente a evolução da doença e a ausência da personalidade de uma pessoa que conheci.

O momento mais forte foi quando constatei que vovó não mais falava, nem andava ou mesmo abria os olhos. O corpo dela ainda resiste, mas a consciência que conheci já não mais se manifesta.

Como escreveu o poeta futurista Vladimir Maiakovski (1893-1930), “morrer não é difícil, o difícil é a vida e seu ofício”.

Alfredo Henrique

Repórter da Folha Metropolitana

[email protected]


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